quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Textos e sinceridades

Os textos se alimentam de emoção. Se inflam e ganham forma com ela. Não todo texto, mas os textos que só têm seu significado quando textos. Nisto se livram os manuais de eletromésticos, as notícias, as esterelidades com cascas de palavras.

Mas os textos de verdade, as poesias, as boas propagandas (sim, isso é uma heresia para muitos, eu também tenho muitas questões com a publicidade, só que elas dependem sim de emoção), as declarações no guardanapo, as músicas, tudo isso é vela do barco. Não se enche sem o vento, não zarpa, não vai, bóia no lugar.

Acho que até agora eu fui mais divagante que o normal, então vamos chegar a algum lugar.

Eu vivo dos textos. Eu vou buscando as palavrinhas na cabeça para viver, qual o mendigo busca as moedinhas. Cada palavrinha encaixada ali é um real no meu bolso, um pedaço de jantar. Às vezes as palavras juntas fazem um banquete. E também tem os jejuns...

Sobre eles: quem vive das palavras sempre encontra um problema quando as emoções não ajudam. Se você não está ok, bem difícil fazer um texto aceitável. Eu estava relutando em usar esta comparação bem vulgar, mas é como uma prostituta que não pode fingir o orgasmo. Você tenta vender a idéia, mas é claro que não funciona. O cliente olha, cospe na sua cara, ri com despeito perante o fracasso, e você aí entende porque é mais fácil fazer músicas sobre os momentos tristes.

Por isso mesmo, e talvez eu devesse ter pensado nisso quando escolhi este ofício, é uma questão de coragem rumar o caminho das palavras. Elas são muitas e muito garbosas, cada qual com seu charme, todas parecem ter usos infinitos, mas escrever é traiçoeiro como montar um relógio.

Eu procuro soluções de quem sabe lidar com estes momentos. Para muitos, talvez para você que conhece esse pedaço de mim em forma de texto agora, eu sou a pessoa que devia ter esta resposta. O mais próximo que consegui chegar (e não me orgulho de falar) é "treino". Você escreve tanto que depois de um tempo não precisa mais se preocupar porque a criatividade "fica treinada". Mas eu sinto tanto orgulho disso quanto sentiria de um orgasmo fingido.

O texto para mim deveria ser guiado por pura inspiração. O retrato de um fenômeno fascinante e momentâneo. O retrato de um cometa.


Vou juntando moedinhas.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Seres urbanos (ou "A vida na cidade")

Após quase duas semanas longe dos palcos, peço a voz e a vez de novo. O assunto, na verdade, é uma conversa que eu tive com o Brunão outro dia. Explicava uma coisa que eu sempre pensei, algo que eu nem falo muito porque muita gente nem tentaria entender.

A trilha sonora do post pode ser um City of Tiny Lights, do Zappa.

Quais são os seres que vivem bem na cidade, fora o homem?

Cães, gatos?
Não, eles não vivem bem. Eles sobrevivem de restos humanos, no caso dos gatos até consegue-se alguma caça, mas isto não justificaria o número em que eles são encontrados.

Os seres que vivem na cidade de verdade, sem depender de nossa bondade (intencional) são: pombas, ratos e baratas.

Eu não estou vendo a sua reação - isso é a metafísica do texto, ele está escrito muito antes de você ter a reação, mas conversa com você, como o Marlon Brando com o Super-homem - mas é bem provável que você tenha uma certa torcida de nariz, o conhecido "nojinho".

Porque são sujos, não é mesmo? É isso que as pessoas falam deles. "Ratos são imundos", "pombas trazem doenças", "baratas são nojentas".

Agora, vamos aprofundar a análise. Esses animais produzem sujeira própria? Sim, o tanto quanto qualquer espécie correspondente em porte. O rato, quase o mesmo tanto que um coelho, etc. Eles não são produtores de sujeira em si.

O que os diferencia dos demais é que conseguem viver nas cidades. E é isso que gera o desgosto. Olhamos para estes animais e a coisa mais ultrajante que nos passa na cabeça é que eles conseguem sobreviver à nossa sujeira. Isso para a maioria é nojento.

Estes três, em vez de minguarem com a nossa presença, se adaptaram.

Agora vamos falar de limpeza. Na próxima vez que você vir uma pomba ou barata, ou pensar em um rato (ele geralmente é muito esperto para que você o veja, mas ele está lá também), você pode fazer um exercício. Olhe para tudo que você vê de sujo nele e pense no quanto daquilo saiu da sua casa. E de você. Se pergunte se aquele seria considerado sujo se você, nobre cidadão bípede e asséptico, não produzisse nada de lixo nessa cidade.

Impossível, você diz? Bom, então não é meio absurdo que tenhamos uma política de "controle de pragas" mas não tenhamos uma saída inteligente para o nosso próprio lixo?

Desculpe se eu revirei o lixo na sua cabeça. O cheiro vai demorar pra baixar agora. Bom, pelo menos os ratos, as pombas e as baratas já estão acostumados.

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Pelo sim, pelo não

Algumas pessoas não conseguem dizer não em certas situações. Indo além das piadinhas pornôs óbvias (se você pensou em uma, parabéns: você é um leitor de MAD), isso é uma coisa muito complicada.

Como nasce esse efeito? Nasce assim: uma pessoa boa começa a querer ser superlegal e acaba virando o bobo que as pessoas montam em cima.

Sim, isso é bem autobiográfico.

Você começa a dizer sim para todos os programas de índio, idéias fracas, coisas que não dão em nada, toda sorte de atrasos de vida que aparecem. E nesse caso podemos dizer que uma adição às leis de Newton seria: "Os atrasos de vida tendem a se mover e aderir às pessoas que não dizem não."

A solução para isso seria ficar esperto, aprender a ser duro com as pessoas. Mas quem me entende sabe que ser duro com as pessoas não é algo que se deseja fazer. Ou você o faz naturalmente (falta alguma fibrinha no coração) ou você se sente um carrasco.

Agora, o problema de verdade: quando você não diz não para as pessoas, acaba sem querer machucando as pessoas que só merecem ouvir sim. Porque elas estarão a seu lado quando você estiver de mau humor por ter aceitado um programa de mico. E podem acabar sendo respingadas por sua raiva.

Para essas pessoas, mais importante que o sim ou o não é o "desculpa-me".

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Primeiros passos

Não sei se o primeiro post costuma ser o mais difícil.

Conversando, outro dia, sobre a possibilidade de criar este blog - o meu primeiro - descobri que não tinha muito bem um tema pro primeiro post. Não tinha nem tema pro blog, mas este problema eu resolvo depois.

A única coisa que consegui, com meu lado advogado do Diabo, foi achar dois problemas que podem afligir o condenado que escreve o primeiro post da vida. Como eu sou novo no lance ainda tinha a sensação que a primeira publicação internética é como o primeiro vôo de um pássaro. Errou, tenta na próxima encarnação porque você já era. Salvo com a ajuda de algum veterinário ou literato.

Os tais dois problemas, lá vão eles.

Primeiro. Todas as pessoas um dia fazem algo mal feito. O Vinícius já escreveu alguma coisa bem Roupa Nova. O Tyson perdeu do Buster Douglas. O Senna foi reto na (sua) última curva. O Poe caiu na besteira de explicar o Corvo. Imagina eu então , que coleciono erros?

O segundo é que um blog define a pessoa. É um recorte, mas tem de retratar o todo. E o todo não é feito para todos. A gente é uma coisa para cada pessoa e num blog (como naquele brinquedo que enjoa na primeira semana, o Orkut) a gente é pra todo mundo um texto.
Bom, daí dava preu entrar naquela semiótica toda, máscaras e personas e Jungs e assim vai... Pra mim isso é meio lance de bêbado fazendo Tai Chi, é patético embora esteja no ritmo certo. A lição de moral é: não quero que o primeiro post me aprisione.

Então, vambora.
Esse não será um blog sobre shows.
Nem sobre textos, e eu vou me controlar pra garantir isso.
Não será sobre nenhum dos meus apelidos, nem sobre as pessoas que eles representam.

Esse blog vai ser meu primeiro jazz. Bem beebop. Vou improvisar tudo, tendo de base alguma frase do baixista.