terça-feira, 30 de junho de 2009

Palavras livres


Quando, às vezes, chego em casa mais cedo que meu sono (e muito depois da hora de jantar), tudo que ainda me guia é escrever.

De antemão já peço desculpas. O fato é que não estou tão familiarizado com esse teclado, nem com as ideias que correm como loucas na cabeça - naquele mesmo frenesi que as crianças pela primeira vez sentem no pega-pega na sala da cristaleira.
Escrevo agora só porque sim, porque cada dedo sente uma vontade doida [e doída] de apertar uma tecla. E cada um, querendo roubar a vez do outro, se insere em uma grosseria que, por final, constitui um texto, como seus pares que estão aqui. E nasceram da mesma maneira.

Os textos não são meus. Nunca foram. Se você achava que eram, pode me condenar como um farsante. Eles são tão somente dessa necessidade de apertar esses botões pretos para gastar essa vontade - desviar essa loucura. Para dentro da máquina, para quem quiser ler: eu nunca sei.

Nunca sei, quando começo, se esse vai ser o texto dos 20 calorosos ou dos dois secos comentários - sendo um meu, tentando explicar um mal-entendido de uma digitação auto-centrada.

Nem sei nunca, aliás, se o texto será escrito até o final. Deus - com D maiúsculo porque esse mundo só faz sentido se houver alguém para me condenar pelos falsos acertos das minhas escolhas - sabe quantos posts não foram começados e nunca acabados. Quantas vozes aflitas se emudeceram perante a inesperada visita do superego que visita repentinamente a cachola (E se não fossem esses programas da Cultura, condenaria com estalares de língua no mais correto português a palavra 'cachola'). Eu admito: muitas vezes já desisti no meio. Abandonei as palavras em alto-mar, quando elas só esperavam de mim um fechamento para sobreviver e construir um conto, uma crítica, crônica, sei-lá-o-quê, pretensa estória. Dos meus filhos, você só vê a metade.

Mas quando escrevo, é como comungar com esse mar. À noite, à melhor meia-noite. É aquele entrar sem volta em algo infinito, negro, pleno e sem pressa. É se entregar a tudo que está à frente. Passo por passo, com única certeza que fui mais certo em tudo que no passo anterior. Quando escrevo não ouço mais nada. O mundo começa a argumentar mais baixo. Não se cala de fato, mas para pra me ouvir. Finge que vai falar mas presta mais atenção no que digo do que no que ele mesmo, infinito que só, tem a dizer. É um mar entediado esperando o naufrágo que só se agarra a palavras.

E então estou lá. Sozinho como só Deus esteve, dias antes de tentar seu 'Fiat Lux'. Como Jesus em seu maior momento, não os dos milagres mas o da solidão divina no Monte das Oliveiras. E é a mesma sensação que senti no mar, à meia-noite, na praia deserta: eu estou só, mas estou completo. Nada preciso que não as palavras. Afinal, quem rema: eu ou elas?
Talvez elas só queiram sair de mim, se libertar e encontra um algo-outro infinito. Ir até onde consigam mais agir, só ser.

Mas até onde vão, isso nunca mesmo posso saber. É presunção, e é limite. O meu limite, só-escritor.

As palavras foram feitas para serem ditas sem compromisso de voltarem a seu porto de partida.
Eu só as liberto no mar. No mar em que eu escolhi me perder.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Perguntas

Das quais você nunca sabe a resposta.
Por mais que ache que sabe.

Quantas pessoas hoje viram você pela primeira vez na vida?

Qual será seu último melhor amigo?

Quantos países você vai conhecer?

Quem foi a pessoa que mais te amou?

Qual sua maior qualidade?

Qual será seu último prato?

Quanto você já gastou com esmolas até hoje?

E com gorjetas?

E com cigarros?

Sim, qualquer cigarro

Quantas vezes você mastigou do lado esquerdo?

Pelo menos: foi mais vezes que do direito?

Quantas vezes você já cortou o cabelo?

Quantas pessoas moram no seu prédio (ou no da frente da sua casa)?

Quantas vezes você já esteve a um passo de morrer?

Quantos abraços você ainda vai dar?

Qual o melhor abraço que você vai dar?

Você já conheceu a personalidade mais interessante de sua vida ou ainda vai conhecer?

Quantas linhas você vai escrever?

E qual a mais importante delas?

O melhor prato que você vai comer na vida?

(parece que não, mas esta é uma das mais importantes)

Quantas vezes você esteve a um passo de matar?

Quantas vezes você abriu uma porta?

Quantos melhores poemas de todos você já leu?

E quantos vai escrever?

Qual será sua última pergunta de todas?

E qual será sua última resposta?

Qual o motivo de ter mais perguntas do que respostas no mundo?

E qual o sentido destas perguntas?

Será que, pelo menos para essa, você tem um jeito simples de descobrir a resposta?

Não.
Você não sabe a resposta.