quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Despedida em uma noite de luar

E então, quando a noite avançou, o paciente deu um suspiro e disse para a bela mulher a seu lado:
- Doutora, eu vou falar uma coisa muito importante. Você é muito bonita. E, me desculpe, você é ainda mais sexy. Eu adoraria ter conhecido você em outra ocasião, em outra situação. Eu queria ter tido você - só que de outra maneira. Eu sei que você me acha louco pelo que eu tentei te convencer hoje. Mas, infelizmente, eu não sou um louco. Infelizmente - muito, muito infelizmente - tudo que eu te contei era verdade. E essa é a última vez que nós - do jeito como estou agora - nos falamos. De um jeito ou de outro. Porque você pode acreditar em tudo que eu disse e sair agora. E ir o mais longe que você conseguir. E se salvar, porque eu vou, depois que acontecer, desaparecer daqui e nunca mais voltar. Ou você pode não acreditar em nada, e ficar aqui comigo preso nessa maca, achando que eu sou só mais um desses caras que inventa um desculpa imensa - e mais ainda absurda - para não ter de ficar aqui. Mais uma pessoa que aparece com um ferimento normal e mente o quanto consegue para fugir desse cheiro de hospital. E então tudo vai acontecer como toda noite como essa. E eu vou atrás de você, porque é você que estou desejando agora, e é você que eu vou buscar assim que ela aparecer todinha. E então eu vou te alcançar, e te agarrar. Em todo caso, amanhã eu não vou mais te ver. E o mais engraçado é que se eu conseguir você para mim, vou sentir o seu gosto na minha boca para sempre.

Estas foram as últimas palavras do paciente, enquanto uma lágrima solitária escorria de seu olho que começava a se transformar. Naquele exato momento em que a lua se completava cheia, e ele se metamorfoseava.

No fim, ele estava certo, era verdade. Ele era um lobisomem.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Pequeno vazio

Eu odeio quando meus gatos somem.
Odeio quando eles se trancam em um forro, em um teto. Quando se exilam no topo de uma árvore.

Hoje aconteceu.
O cão a agarra. Ela escapa. Agarra de novo. Escapa mais uma vez (se eles desistissem algum dia de escapar, tinham sido extintos na Idade Média).
E corre. E pula um muro. E outro. E se esconde em um forro.

Responde com seu miado, mas não aparece.

Uma chuva se aproxima na tarde de hoje.
Uma escada me espera, junto com meu desajeito com alturas.

Hoje à noite eu saio daqui e vou direto para Pinheiros.
Vou tentar, pela milésima vez (quisera eu que o número fosse redondo assim, indicava fechamento de ciclo ou, ao menos, poesia) salvar um gato.

Pode ser que Deus, como já fez muitas vezes, a salve antes.
Pode ser que Ele, como em muitas outras, me use de instrumento para salvá-la.
Eu não aceito nenhuma outra possibilidade.
Nem com a tempestade contra mim.